quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Vão deixar o transporte escolar de Brasília entrar em colapso?

O Decreto Distrital 23.234/2002, em seu artigo 5º, impõe que o Serviço de Transporte Coletivo de Escolares no Distrito Federal (STCE/DF) deve ser prestado mediante permissão concedida pelo DETRAN/DF.

Devido à baixa rentabilidade do serviço de transporte de escolares, fruto da concorrência desleal de transportadores que praticam preços que não cobrem os custos, entre outros motivos, vários permissionários deixam de exercer a atividade.

De outro lado, existem interessados em prestar o serviço, mas estão impossibilitados, haja vista que novas permissões somente serão concedidas mediante concorrência pública, conforme art. 7º do citado decreto. Assim, tornou-se prática comum a transferência da permissão para prestação do STCE/DF, daqueles que não querem mais prestar o serviço para os novos interessados, amparados no artigo 6º da Lei Distrital 2.819, de 19 de novembro de 2.001.

A permissão para prestar serviço público está regulada pela Lei 8.987/95, que prevê a possibilidade da transferência da permissão ou do controle societário da empresa permissionária. Contudo, prescreve que as transferências só podem ser realizadas, mediante prévia anuência do poder concedente. A falta desta anuência resulta na caducidade da permissão, que poderá ocorrer, igualmente, se o permissionário paralisar a prestação do serviço[1].

O parágrafo único do art. 1º da Lei 8.987/95 dispõe que: “... o Distrito Federal e os Municípios promoverão a revisão e as adaptações necessárias de sua legislação às prescrições desta Lei,...”. Destarte, embora haja uma ADIN [2], visando suspender a eficácia do artigo 27 da Lei 8.987/95, dúvidas não há de que, enquanto não tenha uma decisão da Suprema Corte, o dispositivo continua em vigor.

Assim, para que um permissionário transfira a permissão ou altere seu controle societário, além de atender ao disposto nos artigos 8º, 9º e 12 do decreto Distrital 23.234/2002, devem obedecer ao prescrito na Lei Federal, que se aplica também às permissões [3]:

Art. 27. A transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão.

§ 1o Para fins de obtenção da anuência de que trata o caput deste artigo, o pretendente deverá: (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 11.196, de 2005)

I - atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço; e

II - comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor.

§ 2o Nas condições estabelecidas no contrato de concessão, o poder concedente autorizará a assunção do controle da concessionária por seus financiadores para promover sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

§ 3o Na hipótese prevista no § 2o deste artigo, o poder concedente exigirá dos financiadores que atendam às exigências de regularidade jurídica e fiscal, podendo alterar ou dispensar os demais requisitos previstos no § 1o, inciso I deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

§ 4o A assunção do controle autorizada na forma do § 2o deste artigo não alterará as obrigações da concessionária e de seus controladores ante ao poder concedente. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005). [grifou-se]


Não podemos esquecer que o poder permitente deve, sempre, observar o equilíbrio econômico-financeiro dos permissionários.

É fato que, em algumas regiões de Brasília, há excesso de oferta do serviço, ocasionado pela prática da transferência da permissão, nos casos em que o cessionário não continua a prestar o serviço na região que era atendida pelo cedente, permissionário anterior.

Esta prática tem levado os permissionários a competirem deslealmente entre si, cobrando, ano após ano, preços cada vez menores, agravando a baixa remuneração do serviço e por conseqüência, diminuindo a qualidade e da segurança, indispensáveis no transporte de crianças e adolescentes. Os que não suportam esta concorrência transferem a permissão para terceiros, reiniciando o ciclo vicioso, que só tem trazido prejuízos a todos. Permissionários e usuários.

A transferência legal visa garantir a continuidade do serviço. Assim, se um permissionário deixa de prestá-lo, o poder público deve, antes de anuir com a transferência da permissão, verificar se os permissionários remanescentes possuem condições de atender os alunos que aquele atendia. Se possuírem, o poder permitente avaliará, a bem do interesse público, a conveniência ou não de consentir com a transferência, ou determinar que o cessionário atue em uma região que haja demanda.

Não havendo permissionários em número suficiente para o atendimento dos alunos transportados pelo permissionário que se retira, o poder público só deve concordar com a transferência, mediante compromisso, por parte do cessionário, de que continuará a prestar o serviço na mesma região atualmente atendida pelo cedente. Se assim não for, os alunos da região que era atendida serão penalizados pela falta do transporte, o que, evidentemente, contraria o interesse público.

Por outro lado, se for conveniente, para o poder público, a substituição do permissionário, visando suprir demanda existente em outra região, o cessionário também deverá firmar compromisso com o DETRAN/DF de prestar o serviço na região determinada pela autarquia. A constatação da existência desta demanda deve obedecer ao disposto no artigo 2º da Lei 2.994/2002.

Portanto, não restam dúvidas de que a transferência da permissão deve respeitar as formalidades previstas na legislação, devendo o DETRAN/DF, também, fazer minuciosa análise da transação, objetivando constatar a conveniência da transferência e se o cessionário atende todas às exigências legais, além de verificar se o mesmo possui condições de continuar a prestar o serviço nos termos do § 1º do artigo 6º da Lei 8.987/95.

Importante ressaltar que se o permissionário paralisou a prestação do serviço, ou está atuando de forma irregular, constatado mediante a não renovação da autorização de tráfego, o poder público deve, de ofício, declarar a caducidade da permissão, não permitindo, em hipótese alguma, sua transferência.

Diante desta situação, o Governador eleito deve atuar, imediatamente, no sentido de suspender a transferência das permissões, ou do controle societário das empresas pemissionárias, até que se realize o estudo da demanda reprimida prevista em Lei, ou até que sejam adotados procedimentos administrativos, adequados e necessários, objetivando atender a legislação federal.

Caso contrário, o sistema de transporte escolar de Brasília, que ao contrário do sistema convencional, ainda presta um bom serviço aos estudantes, entrará em colapso. Queira Deus que nenhum acidente grave aconteça para só depois as providências serem tomadas.

Pense nisto, Governador. Aja.



[1] Arts. 27 e 38 da Lei Federal 8.987/95.

[2] ADI 2946

[3] Parágrafo único do artigo 40 da Lei Federal 8.987/95.

Um comentário:

  1. Pra completar, os "caciques" do transporte escolar em Brasília, tiveram a incrível sorte de os editais pra licitação do tão cobiçado transporte de escolares da SEE estão exigendo a permissão, assim beneficiando os mesmos que, coincidentemente são permissionários. Assim, quem tem ta dentro, quem esta de fora não tem a menor chance pra uma concorrência justa.

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